O cálculo limitador de Christopher Nolan: Tenet (idem, 2020)

cemitério do esplendor
3 min readJan 26, 2024

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Por: João Marco

O cinema de Christopher Nolan é movido inteiramente por uma espécie de cálculo que procura racionar e dosar os elementos da imagem e do som em suas obras, uma espécie de “controle mecânico” que equilibra tudo. Se, por um lado, isso pode até soar positivo, na prática, essa abordagem do diretor se revela limitadora, mantendo os filmes sempre aquém de seus potenciais gráficos e até mesmos dramáticos.

Em Interstellar, de 2014, por exemplo, toda a carga emocional do roteiro é encenada de maneira apática por Nolan, jogando toda a emoção fora em uma dramatização robótica do núcleo humano. Outro exemplo é Inception, de 2010, na qual o realizador jamais alcança o máximo das capacidades gráficas do seu conceito dentro do mundo dos sonhos. Sempre parece ter uma barreira que impede o filme de alcançar o ponto mais alto dessa parte conceitual. E, infelizmente, esse é um problema que permeia Tenet, seu mais novo projeto, que acaba por sofrer com uma administração frágil da exposição visual do mundo que cria.

Nolan até cria uma premissa interessante e repleta de potencial, mas o problema mesmo é como o diretor articula essa abordagem gráfica limitada de seu mundo e das possibilidades dentro desse mundo. Basicamente, sempre que necessita expor o seu conceito, o realizador opta por uma exploração que imprime suas ideias visuais de modo omitido, oculto, mal dá para compreender perfeitamente como ele funciona de maneira prática, já que a utilização dela na ação é velada por uma decupagem genérica, com cortes excessivos e enquadramentos fechados, impossibilitando a noção do artifício dentro de uma dinâmica preguiçosa.

A sequência em que o protagonista (John David Washington) volta no passado é essencialmente filmada de modo fechado, quase nunca a câmera permite que o público contemple a mise-en-scène dos ambientes, jamais deixa o espectador admirar a exploração gráfica dentro daquele universo, resumindo a mesma em planos isolados onde vemos as coisas ao contrário, mas nunca propondo um impacto completo, apenas uma metade dele.

Toda essa omissão é mais uma forma do diretor reforçar essa aura pseudointelectual que tenta transmitir em seus filmes, uma abordagem que acredita ser mais complexa ao dar voltas em sua narrativa em prol de causar uma confusão artificial e que dura apenas durante a projeção. É uma complexidade muito mais forçada do que natural, sem uma funcionalidade dentro da exploração narrativa e conceitual, apenas com o intuito de provocar essa sensação confusa puramente imediatista e vazia.

O diretor não quer que venhamos a sentir as imagens, não se interessa em propor essa experiência audiovisual que alcance todas as suas capacidades de exploração gráfica, ele quer apenas entregar uma “questão de matemática”, um filme que acredita ser inteligente simplesmente por atirar contextualizações didáticas no público, com o intuito de ouvir os aplausos assim que sobem os créditos.

E o diretor aqui está no piloto-automático, simplesmente reproduzindo os piores vícios de sua filmografia na tentativa desesperada de arrancar algum impacto: a montagem paralela da Jennifer Lame e a trilha do Ludwig Göransson são apenas reproduções genéricas do trabalho antes realizado pelo Lee Smith e Hans Zimmer, nunca concebem algo próprio e são apenas orientados pelos padrões do artista de realizar sua obra. Em síntese, Tenet é mais uma produção de Christopher Nolan que jamais concretiza completamente os potenciais de exploração gráfica do seu conceito e do seu universo — com uma exceção ao surpreendentemente eficaz ato-final.

Uma reprodução exata dos mesmos problemas enfrentados em A Origem, aonde a obra jamais chegava ao ponto máximo do que criava, se fechava em uma caixa que procura dosar tudo como um cálculo genérico e autoindulgente na qual a real intenção é criar essa pose “intelectual” que se revela superficial e prejudica uma obra que, talvez em mãos mais adequadas, fosse uma produção superior.

Da forma que é, se revela como uma experiência burocrática como ação, pseudointelectual como ficção científica e frágil em todo o resto.

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